terça-feira, 2 de agosto de 2011

Série Resenha Crítica IV

Hermenêutica Bíblica e Ponto de Vista

Albert Einstein, Isaac Newton e

o Problema da Interpretação Bíblica

D.F.Izidro

James W. Voelz, “‘Newton and Einstein at the Foot of the Cross’:A Post-Modern Approach to Theology,”  Concordia Journal  25/3 (Julho 1999): 264-279.

Do que Trata o Artigo

           O artigo pretende “resolver” as aparentes contradições teológico-conceituais da Escritura com base na idéia de um “entendimento por perspectiva”,isto é,que os mesmos dados aparentam ser diferentes, e/ou contraditórios,dependendo do ponto de vista do observador.

         Para ilustrar a proposição, usa-se o conto dos cinco cegos, em que cada qual descrevia o elefante a partir de sua perspectiva e seu ponto de “observação” (ou “percepção”,no caso dos cegos).

         A seguir o exemplo com base na física de Newton e na contemporaneamente classificada física de Einstein. A física clássica de Newton (antes do século XX), que descrevia o Universo como previsível, estável e claramente descritível, é, após a chegada da física contemporânea (após o século XX), considerada meramente fenomenológica, a saber, a maneira como as coisas parecem ser a partir de nossa experiência e da maneira como a realidade se nos apresenta e nos atinge. A física representada por Albert Einstein, por outro lado, em oposição à antiga, descobre e concebe que na verdade o universo é bastante incomum, instável e imprevisível. Segundo se argumenta nesse artigo, as duas perspectivas físicas, tanto a de Newton, quanto a de Einstein, estão corretas,dependendo apenas de seu ponto de vista.

         Explica-se a conciliação ou não contradição destas duas perspectivas de concepção física como segue: “Dependendo da sua perspectiva – humana, por um lado, ou subatômica/supragalática, por outro lado,o universo parece bastante diferente e age de forma bem diferente.”. Essa conciliação da física tradicional e contemporânea é aplicada as Escritura no que diz respeito ao aparente contraste entre a Iniciativa de Deus e a Participação Humana.

         Esse estudo conclui que essas duas visões teológicas também estão corretas, sendo apenas uma questão de “perspectiva”. O mesmo princípio, então, deve ser aplicado à interpretação das Escrituras, onde alguns textos são, em analogia ao que foi exposto acima, de natureza “newtoniana”, e outros “einsteinianos”. Cada qual deve ser interpretado de conformidade com sua perspectiva apresentada.

         O modo como as diferentes denominações abordam os mesmos assuntos de perspectivas diferentes, mas igualmente válidas, nos sugere sermos mais tolerantes para com as mesmas, pois algumas são mais “profundas” em sua teologia (“einsteiniana”), e outras mais superficiais (“newtonianas”). O valor, portanto, de uma pregação mais prática (“newtoniana”), sem desprezar uma abordagem mais profunda (“einsteiniana”) também é considerada fundamental. O articulista luterano conclui dizendo que a partir dessas “leituras de perspectivas”,é possível e recomendável a tolerância luterana para com os aparentes contrastes antinomistas da teologia,tais como Lei e Evangelho.

Análise Crítica

          Considero que talvez haja valor pedagógico nessa visão de perspectivas. Contudo, não sei se a mesma resolve de fato o problema da conciliação entre opostos, isto é,sobre o que é real e o que parece ser. Quero dizer que, do ponto de vista da física, não obstante a diferença de perspectivas,demonstrou-se que Einstein estava exatamente “correto”, e Newton “equivocado”. A linguagem fenomenológica não é exata, nem correta, mas apenas aparente. A descrição “científica” diz respeito à descrição da realidade, o que difere, nesses termos,da linguagem fenomenológica.

         Podemos exemplificar falando sobre o “pôr do sol”: fenomenologicamente falando, é o sol que se movimenta, que nasce e se põe – é o que parece ser;contudo, uma descrição real e exata do fenômeno revela que na verdade o sol não se movimenta,senão o globo terrestre em sua órbita. Qual é a verdade, então? Que explicação é a correta? A de que o sol se põe ou a de que a terra gira em torno do mesmo? Obviamente que a segunda alternativa é a correta como já fora constatado pela pesquisa científica.

         No campo teológico, penso haver a mesma situação. Não obstante a Iniciativa de Deus e a Participação Humana possam ser consideradas e abordadas como “pontos de vista diferentes” ou perspectivas distintas, a pergunta que se impõe ainda é: teocentrismo ou antropocentrismo?, monergismo ou sinergismo? Colocando de outra forma, sendo a leitura antropocêntrica (no caso) “newtoniana” ou fenomenológica, essa seria uma leitura tão equivocada quanto à do pôr do sol,e a leitura “einsteiniana”,do que de fato ocorre,é que seria a explicação correta,isto é, o teocentrismo. E vice-versa, dependendo do que se toma por perspectiva de “Einstein” e de “Newton”.

         Certamente que cada linha teológica fará suas próprias classificações aqui, seja calvinismo ou arminianismo. Contudo, a pergunta pelo que é correto, tanto para “Newton” e “Einstein”, quanto para “teocentrismo” e “antropocentrismo” ainda se impõe, se nossa busca é a exatidão da explicação da realidade teológica e/ou científica. Portanto, a visão de perspectivas pode ajudar na apreciação de cada fenômeno separadamente, contudo deixa em suspenso a verdade sobre o que realmente ocorre. A partir desse raciocínio, a declaração de que “ambos estão corretos”,tanto para Einstein e Newton,como para teocentrismo e antropocentrismo é falsa. A busca da intenção autoral bíblica, portanto, ao meu ver, deve continuar e se impor no processo de construção teológica.

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