terça-feira, 16 de agosto de 2011

Romanos: O Evangelho de Paulo VI


Aspectos Literários da Epístola aos Romanos I

Gênero Literário de Romanos

d.f.izidro

1. Preliminares

         O caráter literário da carta aos Romanos se distingue de modo acentuado do das outras cartas paulinas. Do ponto de vista temático e do rigor da estrutura, ela se assemelha a epistola aos Gálatas. Contudo, a motivação e a situação concreta de Gálatas faltam inteiramente em Romanos.

         Muitas tentativas têm sido feitas no sentido de enquadrar Romanos em uma determinada forma literária da Antigüidade: memorando[1], carta retórica[2], nota diplomática[3], carta protréptica (exortativa)[4] e ensaio epistolar[5], dentre outras.

         Não obstante, Romanos não parece encaixar-se plenamente em nenhum desses gêneros literários contemporâneos. Quiçá, a Epístola possua, de fato, semelhanças com todos esses gêneros, indicando, assim, que Paulo utilizou diversas convenções literárias de seu tempo (Carson,Môo,Morris,1997).

         Contudo, a despeito das dificuldades de definição de gênero literário para Romanos[6], algumas características literárias e mesmo algumas sugestões de gênero literário parecem bem plausíveis e bastante constatáveis à luz do próprio texto da epístola, como veremos a seguir.

         Começaremos, no entanto, com algumas correções de gêneros literários atribuídos a Romanos.

2. Diatribe Polêmica?

         Bultmann e outros têm comparado Romanos à Diatribe, isto é, gênero de debate quer popular entre filósofos cínico-estóicos.[7]

         As características da Diatribe encontradas em Romanos são as seguintes: o discurso direto feito a um oponente ou interlocutor (cf.2.1,17), perguntas retóricas e o emprego de “de maneira nenhuma!” (mh genoito [mè génoito]) para rejeitar as inferências encontradas nessas perguntas (cf.3.3-4,5-6;6.1,215;7.7,13;9.14;11.1,11).

         Bultmann entendia que a Diatribe tinha intenção polêmica, mas estudos recentes têm chamado a atenção para o papel educativo da Diatribe e levantado a questão de se ela deve mesmo ser considerada um gênero literário.[8]

         Em todo caso, não obstante partilhe alguns aspectos da Diatribe, Romanos como um todo não deve ser classificado como tal (Carson,Môo,Morris,1997).

3. Carta-Tratado

         Romanos já fora considerada um tratado teológico Atemporal, ou seja, um “compêndio de teologia cristã” (Melanchthon) que transcende o tempo. Não obstante, Romanos não pode ser resumida, mesmo diante de suas características tratadícias e sistemáticas, a um tratado de teologia sistemática da igreja cristã primitiva.

         A epístola aos Romanos possui características de correspondência particular e está inserida em uma moldura de carta (1.1-17;15.14-16.27), além de ter sido escrita a destinatários em uma situação específica.

         Contudo, também não pode ser considerada uma mera carta ou epístola, pois desenvolve com maestria sistemática sua teologia (1.16,17:1.18-8.39). A parte doutrinal não está apenas estruturada com exatidão e de modo lógico, mas também revela apurada técnica de composição que encaixa as subdivisões ramificadas umas nas outras claramente: 3.9-20 resume 1.18-3.6ss;5.1 refere-se a 3.21-4.31;8 repete os pensamentos de 5.1-7 sob novos aspectos;9-11 aplica o tema da “justiça de Deus” de 1.18-8.39 ao povo de Israel. Paulo também fecha os grandes blocos coesos por meio de textos hínicos (cf.8.38s;11.33-36).

         A pergunta sobre se Romanos deve ser considerada como uma carta ou como um tratado, não faz sentido nesse caso. Pois a epistola aos Romanos sobrepõe as duas coisas. Mas de tal forma que as porções de caráter de tratado estão subordinadas à finalidade da carta, sendo um componente integrador da mesma. De modo que Romanos não é um tratado em forma de epistola, mas, grosso modo, uma epistola em forma de tratado (Vielhauer,2005).


BIBLIOGRAFIA

BROADUS,David Hale.Introdução ao Estudo do Novo Testamento.Rio de Janeiro:Editora Juerp,1983.
CARSON,D.A.;MOO,Dougla;MORRIS,Leon.Introdução ao Novo Testamento.São Paulo: Editora Vida Nova,1997.
CULLMANN,Oscar.A Formação do Novo Testamento.São Paulo:Editora Sinodal,1984.
GUNDRY,Robert H.Panorama do Novo Testamento.São Paulo:Vida Nova,1978.
KUMMELL,W.G.Introdução ao Novo Testamento.São Paulo: Paulus/Teológica,2003.
QUESNEL,Michel.Paulo e as Origens do Cristianismo.São Paulo:Paulinas,2005.
TERRA,João E.M.Revista de Cultura Bíblica – Cartas de São Paulo.São Paulo:Edições Loyola,2000.
VIELHAUER,Phillip.História da Literatura Cristã Primitiva.São Paulo:Academia Cristã,2005.


[1] Klaus Haacker,Exegetische Probleme des Römerbriefs (NovT20,p.2-3).
[2] Wilhelm Wuellner, em Paul’s rhetoric of argumentation in Romans: an alternative to the Donfried-Karris debate over Romans (em The Romans debate,p.160-5).
[3] Robert Jewett,Romans as na ambassadorial letter (Int 36,p.5-20).
[4] Stanley K.Stowers,Letter writing in Greco-Roman antiquity (p.113-4).
[5] Martin Luther Stirewalt Jr.,Appendix: the form and function of the Greek letter-essay, em The Romans debate (p.175-206).
[6] Segundo Carson, Moo e Morris, “..é arriscado tentar estabelecer uma identificação mais específica do gênero literário” de Romanos (In:Introdução ao novo testamento.p.278).
[7] Rudolf Bultmann,Der Stil der paulinischen Predigt und die kynisch-stoische Diatribe,FRLANT 13.
[8] Stanley K.Stowers,The diatribe and Paul’s letter to the Romans,SBLDS 57.

Nenhum comentário:

Postar um comentário