quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Documentos do Cristianismo Primitivo II

39ª Carta Festiva Pascal de Santo Atanásio[1]

A Primeira Lista Oficial de Livros do Novo Testamento

D.F.Izidro

Santo Atanásio (295-373), bispo de Alexandria, no Egito, fez circular, em sua 39ª correspondência festiva de Páscoa dirigida às igrejas sob sua responsabilidade, o mais antigo elenco canônico e/ou oficial dos livros que deveriam ser recebidos por toda a Igreja Católica Apostólica e Una do cristianismo antigo como Palavra inspirada e normativa de Deus, datado de 367 d.C. É a primeira vez que os 27 escritos do Novo Testamento como o temos hoje são apresentados como lista oficial dos livros que deveriam ser aceitos como Sagrada Escritura pela Igreja Antiga. Esse elenco canônico oficial de Santo Atanásio, que será reafirmado depois em 397 d.C., no Concílio de Cartago, África do norte, também serve, por seu caráter anti-heterodoxo e anti-apócrifo, como evidência da exclusão dos movimentos alternativos do cristianismo antigo, cujo principal representante é o gnosticismo, e sua literatura extra-canônica. Constitui-se importante fonte histórica que nos ajuda a compreender o complexo e longo processo de reconhecimento canônico dos escritos do Novo Testamento.[2]

Já que falamos dos hereges como de mortos, e de nós mesmos como possuidores das divinas Escrituras para a salvação; receio porém, como Paulo escreveu aos Coríntios [2Co.11.3], que algumas pessoas ingênuas possam se desviar de sua simplicidade e santidade pela astúcia de alguns indivíduos  e se deixar enganar porque os livros apócrifos têm nomes idênticos aos autênticos . Por esse motivo, eu vos peço ter paciência comigo,se,para o bem e a necessidade da Igreja,repito na minha carta admonições que estais acostumados a ouvir.

Nesse meu propósito de vos falar sobre esse assunto, eu vou me valer do exemplo do evangelista Lucas, e começo assim (Lc.1.1-4): Já que alguns se atreveram por sua própria autoridade a compor os chamados Apócrifos e a misturá-los com as Escrituras Inspiradas por Deus – sobre as quais temos a certeza garantida pelas testemunhas originais e ministros da Palavra entregue aos nossos pais – eu também ungido por alguns irmãos fieis e depois de ter investigado a matéria desde os inícios,resolvi organizar os escritos que entraram no Cânon,transmitidos e confirmados como sendo divinos,para que os que foram enganados possam condenar seus falsários e os que ficaram firmes possam se alegrar com a confirmação de sua fé.

[Atanásio cita primeiramente os livros canônicos do Antigo Testamento, excluindo os deutero-canônicos, considerados apenas como leitura de edificação pessoal .- Em compensação,os 27 livros do Novo Testamento são mencionados aqui pela primeira vez,num catálogo que se tornará definitivo.]

Em continuação, devo citar sem hesitar os Escritos do Novo Testamento. São os seguintes: os quatro evangelhos, segundo Mateus, Marcos, Lucas e João; em seguida, os Atos dos Apóstolos e as 7 cartas denominadas “Católicas”;1 de Tiago,2 de Pedro,3 de João,e,depois destas,1 de Judas. Seguem as catorze epístolas do Apóstolo Paulo na seguinte ordem: 1 aos Romanos,2 aos Coríntios,e,depois destas,1 aos Gálatas seguida por 1 aos Efésios,depois 1 Filipenses,1 aos Colossenses,2 aos Tessalonicenses,e a Carta aos Hebreus,e imediatamente em seguida,2 a Timóteo,1 a Tito e,finalmente 1 a Filemon. Depois ainda, o Apocalipse de João. Essas são as fontes da salvação, para que,quem tem sede,possa ser desalterar com as palavras nelas contidas. Somente nelas está proclamada a doutrina da piedade. A elas nada se pode acrescentar, nem diminuir.

Para ser completo, sinto-me obrigado a acrescentar que há outros livros além desses,que não entraram no cânon,mas foram indicados pelos Pais como leitura edificante para aqueles que se converteram e desejam instruir-se na doutrina da piedade: a Sabedoria de Salomão;a Sabedoria de Siráque,Ester,Judite,Tobias,a Didaquê dos Apóstolos;e o Pastor. Os primeiros, caríssimos, estão no cânon; os segundos podem servir como leitura edificante;mas nunca sejam mencionados os apócrifos. Esses são falsificações de hereges, que as compuseram como bem entenderam e lhes atribuíram a datação muito antiga, para que possam ser citados como se fossem documentos primitivos e assim enganar os otários.



[1] O texto da 39ª Carta Festiva de Atanásio foi extraída de Revista Bíblica Brasileira. Anos 20-21.Nova Jerusalém.Fortaleza.2003-2004.Extra-Canônicos do Novo Testamento.Tomo I.Evangelhos.pgs.18-20.
[2] Para saber mais e profundamente, veja ,por exemplo, COSTA, Hermisten Maia Pereira.A inspiração e Inerrância das Escrituras.São Paulo: Cultura Cristã,1998;KÜMMEL,Werner Georg.História do Cânone do Novo Testamento. In: KUMMELL,W.G.Introdução ao Novo Testamento.São Paulo: Paulus/Teológica,2003; BARRERA, J.T.A Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã:Introdução à história da Bíblia.Petrópolis:Vozes, 1996; METZGER,Bruce.The Canon of the New Testament.Oxford: Clarendon Press,1987.


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